Vozes e visões internas:
Eu vi- centenas de candeeiros apagando-se à meia
noite. E a vila, toda a cidade, cessando de existir, engolida pelo breu. Uma
imensidão negra sem contornos.
Eu estava no ponto indefinido onde assistia a
esse apagão, diante do meu corpo e mãos que também não via.
Talvez o primeiro
apagão se tenha dado em mim. Seguindo-se tudo o resto.
(O mundo
precisava de mim, afinal?)
Nunca esperei adormecer, mas adormeci.
Ainda respiro, sem nada poder tocar. Duvidando da
existência de tudo.
(Afinal, tudo se cobriu de breu).
( - "Estou no final do jogo? Haverá vida ainda, por detrás desta cortina? É só um
fenómeno de luz e de sombra? ")
Dar forma ao mundo depois deste sono, desta escuridão...Tudo se erguer, outra vez, estar cá sem mim.
(Mas como é sem mim? Quem me assiste para mo dizer?
Agora, nesta hora, nesta meia noite?)
Eu sei como pensei perecer tantas vezes. Mas a vida, o
tempo, a idade, acumulam-se. Acumulou-se-me no sangue mais amargura do que esperava. E não esperava adormecer.
Mas havia,
há ainda, uma pérola dentro. Maculada, envolta em sal. É o meu eremitério, meu
altar de infância, é o meu amor e o meu tremor - a minha Inocência. (Pudesse) Sobreviver - ao raso, ao baixo, ao frívolo, às
correntes, aos desertos, ao vazio, às cruzes, aos apagões de tudo....
"Para onde me virar se não tenho (ou vejo)
centro? "
- Pensei que havia mapas dentro.
Guardados, escritos, debaixo do nosso sangue. Antes
mesmo de nascermos...
---
(A Saint-Exupéry) ( Escrita corrente)
Drones subaquáticos. De novo a flor e o
seu perfume excruciante. Envolta pelo fumo de uma destruição invisível aos
olhos de todos. Olhou, para o humano. Beijou-lhe a fronte. Disse que era o
gesto universal que nela se tornou o único a poder dizer, em
silêncio, sobre a fidelidade e sobre o amor através do medo. Talvez uma ilha!, é
uma ideia que se escreveu mil vezes. Como todas as coisas mais humanas,
atravessa as eras. Esse mundo dentro do mundo dentro do mundo. Sabias? Queria
ouro derramando-se como alma transbordando nua da carne. Falava de cristais
brutos mas cristais. É tão urgente, neste mundo, dizia a flor, sermos mais que
aquilo que nos fizeram crer. Tem coragem de mergulhar, nesse lago. É fundo e
gelado e solitário. Mas não fujas, ela dizia, não fujas de te encontrar, esse
cristal, esse cristal, desespero por cristais. É que eu acordei num deserto,
quando acordei, havia uma tempestade de grãos chocando-se e eu no meio quase
sufoquei o meu cristal. A solidão era por de mais maior, no deserto. Quase
quis dissolver-se, ser pequena, um grão entre todos. Mas não. Há um sonho que
lhe abraça os ombros. Um mundo dentro do mundo dentro do mundo. Se te
juntasses, apenas, a mim. Seria tirania? Esse abandono do deserto por outro
deserto. Nesse antigo há festas todas as noites, grãos chocando-se,
aquecendo-se. No novo há uma desolação. Primeiro, profunda, fria, tenebrosa.
Depois, familiar, e apenas melancólica. A flor orou - que o amor fosse o
esquecimento do mundo. E contra o peito, um anjo. Contra a cabeça nenúfares
brancos. Contra os lábios uma canção - que não fosse o silêncio vazio no humano
depois das interpelações do cristal. Como duas linguagens de dois mu(n)dos, quebrando-se no cruzamento. Ela arrancou-se dessa terra, disse-lhe
adeus de longe quebrando a imagem desse beijo.
Escorreram gotículas através das pétalas.
Do cristal chorando. Interno, cravado, um cristal tremendo, não duro como
diamante, antes da matéria frágil dos sonhos e da inocência. Porque queria o
impossível como a Lua de Calígula. Mas sem rasto de fome em si. Só um rasto de
desamparo de criança. Pensou numa nova porta. Pensou nesse humano pegando-lhe,
rendendo-se, ao sacrifício da fusão. Dolorosa e gloriosa.
Vozes e visões internas:
Eu vi- centenas de candeeiros apagando-se à meia
noite. E a vila, toda a cidade, cessando de existir, engolida pelo breu. Uma
imensidão negra sem contornos.
Eu estava no ponto indefinido onde assistia a
esse apagão, diante do meu corpo e mãos que também não via.
Talvez o primeiro
apagão se tenha dado em mim. Seguindo-se tudo o resto.
(O mundo
precisava de mim, afinal?)
Nunca esperei adormecer, mas adormeci.
Ainda respiro, sem nada poder tocar. Duvidando da
existência de tudo.
(Afinal, tudo se cobriu de breu).
(Afinal, tudo se cobriu de breu).
( - "Estou no final do jogo? Haverá vida ainda, por detrás desta cortina? É só um
fenómeno de luz e de sombra? ")
Dar forma ao mundo depois deste sono, desta escuridão...Tudo se erguer, outra vez, estar cá sem mim.
(Mas como é sem mim? Quem me assiste para mo dizer?
Agora, nesta hora, nesta meia noite?)
Eu sei como pensei perecer tantas vezes. Mas a vida, o
tempo, a idade, acumulam-se. Acumulou-se-me no sangue mais amargura do que esperava. E não esperava adormecer.
Mas havia,
há ainda, uma pérola dentro. Maculada, envolta em sal. É o meu eremitério, meu
altar de infância, é o meu amor e o meu tremor - a minha Inocência. (Pudesse) Sobreviver - ao raso, ao baixo, ao frívolo, às
correntes, aos desertos, ao vazio, às cruzes, aos apagões de tudo....
"Para onde me virar se não tenho (ou vejo)
centro? "
- Pensei que havia mapas dentro.
Guardados, escritos, debaixo do nosso sangue. Antes
mesmo de nascermos...
---
(A Saint-Exupéry) ( Escrita corrente)
Drones subaquáticos. De novo a flor e o
seu perfume excruciante. Envolta pelo fumo de uma destruição invisível aos
olhos de todos. Olhou, para o humano. Beijou-lhe a fronte. Disse que era o
gesto universal que nela se tornou o único a poder dizer, em
silêncio, sobre a fidelidade e sobre o amor através do medo. Talvez uma ilha!, é
uma ideia que se escreveu mil vezes. Como todas as coisas mais humanas,
atravessa as eras. Esse mundo dentro do mundo dentro do mundo. Sabias? Queria
ouro derramando-se como alma transbordando nua da carne. Falava de cristais
brutos mas cristais. É tão urgente, neste mundo, dizia a flor, sermos mais que
aquilo que nos fizeram crer. Tem coragem de mergulhar, nesse lago. É fundo e
gelado e solitário. Mas não fujas, ela dizia, não fujas de te encontrar, esse
cristal, esse cristal, desespero por cristais. É que eu acordei num deserto,
quando acordei, havia uma tempestade de grãos chocando-se e eu no meio quase
sufoquei o meu cristal. A solidão era por de mais maior, no deserto. Quase
quis dissolver-se, ser pequena, um grão entre todos. Mas não. Há um sonho que
lhe abraça os ombros. Um mundo dentro do mundo dentro do mundo. Se te
juntasses, apenas, a mim. Seria tirania? Esse abandono do deserto por outro
deserto. Nesse antigo há festas todas as noites, grãos chocando-se,
aquecendo-se. No novo há uma desolação. Primeiro, profunda, fria, tenebrosa.
Depois, familiar, e apenas melancólica. A flor orou - que o amor fosse o
esquecimento do mundo. E contra o peito, um anjo. Contra a cabeça nenúfares
brancos. Contra os lábios uma canção - que não fosse o silêncio vazio no humano
depois das interpelações do cristal. Como duas linguagens de dois mu(n)dos, quebrando-se no cruzamento. Ela arrancou-se dessa terra, disse-lhe
adeus de longe quebrando a imagem desse beijo.
Escorreram gotículas através das pétalas.
Do cristal chorando. Interno, cravado, um cristal tremendo, não duro como
diamante, antes da matéria frágil dos sonhos e da inocência. Porque queria o
impossível como a Lua de Calígula. Mas sem rasto de fome em si. Só um rasto de
desamparo de criança. Pensou numa nova porta. Pensou nesse humano pegando-lhe,
rendendo-se, ao sacrifício da fusão. Dolorosa e gloriosa.
MF
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